quinta-feira, 3 de dezembro de 2009

Dificuldades na produção de textos

Tenho estado atenta ao que se tem escrito sobre a aptidão e motivação que os nossos alunos demonstram pela produção de textos e não posso deixar de concordar com o que foi referido, uma vez que também já me deparei com o quanto pode ser assustador para os nossos alunos verem-se confrontados com uma folha em branco. É isso mesmo… a folha em branco! É muitas vezes a dificuldade para começar, para organizar o seu trabalho, até porque sentem a escrita como um momento de avaliação mais formal. Existe a ideia, embora cada vez mais esbatida, que sempre que se lhes pede para escrever é para os avaliarmos. Assumem que a escrita é apenas a maneira mais formal de mostrarem aquilo que sabem, que dominam. Associam poucas vezes a escrita a um prazer, a um modo de expressão, de autoconhecimento, de comunicação.
Vejo os alunos sem interesse pela escrita. Por vezes até gostam de escrever, mas têm noção que não dominam a técnica e, por isso, inibem-se. Deparo-me várias vezes com a seguinte situação: apresento um tema para um texto (as férias, por exemplo); eles até têm muitas ideias e muito para dizer porque fizeram uma viagem e conheceram muitas coisas novas sobre as quais gostariam de escrever. Como sabem que dão muitos erros ortográficos e que isso vai ser avaliado, escrevem qualquer coisa mais simples, que inventam no momento. Mesmo que não sejam formalmente avaliados, não gostam de mostrar as suas fragilidades, de ser confrontados com o erro.
Às vezes é difícil perceber porque é que os alunos cometem erros da mais variada natureza na produção escrita que não cometem nas outras actividades (escrevem um texto com erros ortográficos, não apresentando os mesmos erros nos ditados; enunciam mal o discurso directo, fazendo-o correctamente em exercícios específicos; não aplicam bem as regras da pontuação, sabendo fazê-lo quando a tarefa é apenas pontuar um texto, etc.). Parece-me evidente que há uma dificuldade em mobilizar conhecimentos e competências, tudo parece compartimentado. O facto da escrita requerer a organização em vários níveis e a atenção a múltiplos factores, faz com que sejam alguns aspectos descurados. É a ideia do que ou se escreve ou se coloca a pontuação correcta, ou se escreve ou se atenta aos erros ortográficos ou se escrever ou se evita os erros de estruturação e coesão. Não existe nos nossos alunos uma cultura de planificação, de revisão. Escrevem e está feito, está arrumado. Acredito que os nossos alunos têm dificuldade em escrever, como tal, temos que praticar, praticar, praticar, apenas assim poderemos minorar o embaraço dos alunos perante a escrita. Como está consagrado no novo programa, devemos “permitir múltiplas oportunidades para compreender, produzir, treinar, mobilizar e reinvestir conhecimentos”.
Muito tem sido feito para mudar mentalidades e a afirmação da escrita criativa e lúdica constituiu, a meu ver, um dos pontos de viragem. Atender aos gostos dos alunos, brincar e rir a escrever são elementos essenciais para sermos bem sucedidos. A diversidade de estratégias, a multiplicidade de formatos e a variedade de tipologias trabalhados podem constituir igualmente uma mais-valia no momento de despertar os nossos alunos para a escrita. Parece-me fundamental, também, que a escrita funcional seja trabalhada. Quantas vezes podemos escrever e desenvolver competências sem que os alunos se apercebam que o estão a fazer… Podemos sempre começar do menos formal para o mais formal, complexificando quer em termos de conteúdo, quer em termos formais. Os avisos, mapas de tarefas, programas, regulamentos, entre outros, podem e devem fazer parte dos textos a desenvolver. Trabalham a competência, desempenham uma função, estão dotados de significação e permitem a divulgação dos escritos. Workshops de escrita para alunos, professores e pais também é uma sugestão muito interessante. Já participei em alguns dinamizados pelo Centro de Artes e Ciências do Mar das Lajes do Pico e as crianças gostam e divertem-se com a escrita, por sua vez, professores e pais aprendem novas abordagens e novos conceitos para trabalhar ou consolidar esta competência.
Com certeza todos sabemos de muito que poderíamos fazer e levar para as nossas aulas para motivar os alunos, no entanto, nem sempre a limitação temporal e espacial nos possibilita trabalhar como gostaríamos. Acredito, contudo, que, sendo o ensino da língua reconhecido como domínio capital para o processo educativo, a escola pode também ter uma palavra a dizer. E a minha disse!
Este é o terceiro ano em que levamos a cabo uma experiência de inovação pedagógica que muito nos tem ajudado com a relutância que os alunos evidenciam para ler e escrever. Integramos no currículo uma nova área curricular não disciplinar: Oficinas da leitura e escrita. Assim, continuamos a trabalhar essas competências na aula de Língua Portuguesa, articulando, sem que os alunos se apercebam com as OLEs (como gostamos de chamar). O facto de terem um espaço “neutro” para ler e escrever fez com que eles encarassem a escrita e a leitura de outra forma, sendo visíveis resultados nas restantes disciplinas. Nas OLE não trabalhamos explicitamente conteúdos de português, eles são trabalhados e consolidados, mas de forma “camuflada”. Os alunos sabem que aquela aula é para comunicar, podem ser levados a falar, escrever ou ler. Esta experiência está associada a uma disciplina na plataforma moodle, a que os alunos recorrem para saber o que vão fazer, para realizar algumas tarefas, para divulgar os seus trabalhos e para comentarem e corrigirem os trabalhos dos colegas. O recurso às TIC, tem sido uma mais-valia, uma vez que os alunos associam a leitura e a escrita a algo que lhes interessa, que lhes dá prazer… ao computador. O desenvolvimento da autonomia é também tido em consideração e, como tal, trabalhamos bastante em projectos. No início da aula, os alunos abrem a disciplina na plataforma, consultam o calendário e tomam conhecimento do que têm que fazer. Muitas das vezes são apresentadas várias actividades que o aluno tem que mostrar realizadas no final do mês. É dada ao aluno a possibilidade de organizar e gerir o seu trabalho, de escolher as actividades que vai realizar e quando o fará, desde que no dia previsto tudo esteja pronto. Os professores (trabalhamos em par pedagógico: um de Língua Portuguesa e o outro de uma Língua Estrangeira) podem monitorizar o que está a ser feito por cada um, consultando os fóruns ou as outras ferramentas a que os alunos recorrem. Quando nos sobra um bocadinho de tempo, propomos a visita a alguns site que apresentamos na plataforma. Sites de exercícios de correcção automática. Como estão a jogar nem se lembram que são conteúdos de Língua Portuguesa!
Esta aula é um espaço para o aluno, do aluno e com o aluno. A máxima subjacente é: o professor só faz o que o aluno não consegue. Sou professora do 2º ciclo (as OLE começam no 5º ano) e, por isso, vejo mais mudanças ao nível das atitudes do que dos conhecimentos (embora também sejam visíveis), mas os colegas do 3º ciclo são da opinião de que as OLEs possibilitam grandes progressos. Sei que os alunos estão mais motivados para ler (quando acabam as tarefas mais cedo nas outras disciplinas, pedem para ler o livro que estão a ler nas OLE, quem diria… tirar a leitura da aula de português faz milagres…) e a folha em branco já não os assusta. Se escrevem melhor? Vão melhorando paulatinamente. Se gostam mais de escrever? Sem dúvida. Assim, com os alunos motivados, é mais fácil trabalhar em Língua Portuguesa. Já não temos a barreira da motivação, focámo-nos em aspectos estruturais, na diversidade, na divulgação, etc. Corre melhor, claro! Mas não é perfeito… Um processo tão complexo como a escrita teria sempre que nos causar algumas “dores de cabeça” e tantas que são às vezes!


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